terça-feira, 15 de novembro de 2011

As Novas Oportunidades e o perigo das generalizações

As Novas Oportunidades e o perigo das generalizações

Relativamente às notícias recentes sobre os Centros Novas Oportunidades “O Governo vai redireccionar a rede de Centros de Novas Oportunidades e parte do seu financiamento para o Ensino Profissional, mantendo apenas alguns destes centros com as actuais funções e com financiamento limitado aos que tiverem melhores notas” passo a fazer alguns comentários:

Alguns pressupostos acerca da Iniciativa Novas Oportunidades:

1- Contempla dois eixos distintos: Jovens (Sistema de aprendizagem, Ensino artístico especializado, curso de educação formação e sobretudo Cursos Profissionais) e Adultos que não concluíram o ensino secundário (percursos de educação e formação ou processos de reconhecimento, validação e certificação de competências);

2- Obtenção de resultados decorrentes da aposta no nível secundário de educação como patamar mínimo de qualificação da população portuguesa

Por outras palavras, as Novas Oportunidades albergam várias respostas para a formação escolar e profissional, sendo os Centros Novas Oportunidades centros de diagnóstico e orientação, porta de entrada para percursos de qualificação e não “locais de certificação”, com o objectivo de certificar rapidamente e sem critérios de qualidade uma população pouco qualificada relativamente aos parceiros europeus.

O Ensino Profissional faz parte da mesma iniciativa e poderá, se não houver a fiscalização correcta, contribuir para o objectivo referido sob o n.º2, com riscos de facilitismo e a mesma “falta de qualidade” de que acusam as iniciativas ligadas aos adultos, só que desta vez apostando nos mais jovens.

Na minha opinião é fundamental separar o “trigo do joio” e lutar pela qualidade em toda a Educação e Formação. Isto implica uma avaliação profunda de todo o sistema de ensino, dos alunos que através do ensino recorrente ingressam em Medicina, de todos os “disléxicos” deste país (com tempo suplementar na realização dos exames nacionais) que integraram ultimamente o mesmo curso, das escolas de referência com reforço nas disciplinas específicas ou ainda a proliferação de Universidades Privadas em que se obtêm diplomas, sem reprovações e facilidades questionáveis. O mesmo se aplica obviamente aos Centros Novas Oportunidades, devendo existir uma fiscalização apertada da qualidade em detrimento das Metas, objectivos por vezes incompatíveis.

Tendo concluído aos 23 anos uma licenciatura em Direito na faculdade de Direito de Coimbra em 1986, à data olhava com estranheza os colegas trabalhadores estudantes, “velhos” de 30, 40 ou 50 anos, que apenas surgiam nos exames e pediam o apoio dos privilegiados que podiam ser estudantes no tempo e idade certa. Vinte e cinco anos de vida, dezasseis dos quais como professora do ensino Profissional e dois como coordenadora de um Centro Novas Oportunidades, compreendo-os finalmente.

Num País caracterizado por décadas de elevados níveis de iliteracia/ analfabetismo e que nos últimos quarenta anos tenta recuperar o tempo perdido através de um modelo de ensino aprendizagem dominado pelo método expositivo, é complicado fazer compreender e aceitar pela população a filosofia do balanço de competências.

Em 1992 o ensino profissional era encarado como o refúgio dos incapazes. Caracterizado por uma forte componente tecnológica e pela utilização de metodologias mais práticas nas áreas científica e socio-cultural, só tardiamente começou a ser aceite em Portugal, com grande atraso relativamente aos outros países europeus. Resultados?? Talvez os demonstrados pelos diversos estudos PISA em que Portugal detém um nível de iliteracia a Língua Portuguesa, Matemática e Ciências, batido apenas por alguns dos ditos “países em vias de desenvolvimento”.

Os resultados dos exames nacionais de 2010 do Secundário (Médias: 10,8, Matemática, 10,1 Português, 8,1 Físico Química e 9,6 Biologia) reforçados por 48,7 negativas a Matemática no Básico reforçam a (des) crença no nosso sistema de ensino.

O ritmo de mudança social exige competências cada vez mais vastas e em constante adaptação, como forma de resposta às necessidades de um mercado em mutação. Tendo em conta a contextualização histórica, o balanço de competências surge como resposta à necessidade sentida por alguns países de reconhecer os saberes adquiridos, encurtando os percursos de formação subsequentes e respondendo assim aos maiores níveis de qualificação exigidos por novos empregos, novos desafios.

Num País com baixos níveis de escolarização, elevado número de desempregados, integrado numa União Europeia em que é quase sempre o “último do pelotão” a iniciativa Novas Oportunidades surge como a resposta adequada. Refira-se que no balanço feito pelos 27 países sobre o tema “Recovering from de crisis”, Portugal apresenta este projecto como solução aos novos desafios de (des) emprego.

Acima de tudo, quer no eixo Jovens, quer no eixo adultos, o desenvolvimento de um Pais e o aumento da competitividade dependem da aposta no reforço das competências técnicas apoiadas pelas competência relacionais, pela melhoria das competências de literacia e de informática, pela maior disponibilidade para a aprendizagem, pelo aumento da responsabilidade, da confiança e da eficiência. Quando conseguirmos fazer renascer a consciência e o espírito crítico estaremos finalmente no bom caminho!!!

Vozes críticas são positivas e quando Maria do Carmo Vieira em “O ensino do Português (Fundação Francisco Manuel dos Santos) inicia o capítulo dedicado à Iniciativa Nova Oportunidades com a citação de Jacques Muglioni “Platão advertiu-nos que para formar um escravo é preciso pouco tempo. Instruir e esclarecer homens livres é outra coisa.”, argumentando que (…)a intervenção do professor se resume a um encontro de três horas, no qual elucida os candidatos sobre a realização do seu portefólio(…) e que (…) os professores são também avaliados pelo número de candidatos certificados(..), (..) recebendo os candidatos o seu certificado de 9.º ano em três ou quatro meses, enquanto que no Secundário, o prazo varia entre seis e nove meses(…) generaliza certamente a partir de situações pontuais. O aumento de duração média do processo e do número de horas de formação complementar e de sessões individuais assim o atestam. A não consecução das metas propostas pela maioria (totalidade) dos CNOs também não corrobora aquelas teorias…

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Tenho um comentário a fazer, sobretudo ao nível do processo RVCC, uma das várias respostas inseridas na iniciativa Novas Oportunidades.

    Podemos olhar para o processo RVCC como algo que tem como missão dar um empurrão para as pessoas integrarem o mercado de trabalho, ou promoverem a sua posição no interior de determinada empresa. Pensar as coisas nesta linha é ignorar a conjuntura económico-social em que vivem grande parte destas pessoas, já para não falar da parte emocional fruto de diversos percursos mais ou menos fáceis (há um passado que tem de ser trabalhado).

    O processo RVCC é também uma medida social, de promoção e reabilitação de percursos de vida, para que as pessoas consigam numa primeira instância participarem de uma forma mais esclarecida naquilo que as rodeia (seja no seio da família, na comunidade etc).

    Não existem muitos modelos de educação/formação com esta capacidade de reconversão e valorização de percursos de vida.

    O processo RVCC sustenta-se em instrumentos como a autobiografia, onde o adulto ocupa o lugar central da aprendizagem e se reencontra e aprende através do sentido que atribui à sua própria história de vida. Aos profissionais RVCC cabe orientar estes adultos e fazer com que eles adquiram uma consciência crítica face aquilo que os rodeia, para que participem e reajam, por exemplo, a situações de exclusão social.

    O processo RVCC independentemente da sua duração, tem na sua estrutura instrumentos que outras modalidades de ensino não têm. Não se procuram estandardizações por meio de fichas e testes. Neste processo trabalham-se histórias de vida tenham sido estas mais fáceis ou mais difíceis.

    Neste processo agudiza-se a vontade de aprender mais de pessoas que já largaram a escola há muitos anos, e que aqui ganham coragem para um segundo passo que muitas vezes se trata de um curso profissional numa área específica (quantos não ficam a querer aprender mais sobre novas tecnologias, ou redescobrem a matemática nas suas vidas, ou passam a ter vontade de ler mais e participarem mais como cidadãos naquilo que os rodeia?).

    O processo RVCC só pode ser visto como um modelo fácil e sem impacto se houverem profissionais a trabalharem nesse sentido, o que em várias avaliações já realizadas nem sempre é o caso.

    Avaliação e Qualidade sempre, até para termos redes eficientes, profissionais capazes e que colaborem entre si (a avaliação em grande parte dos casos já é uma prática comum). Não caiamos é na tentação de acabar com mais uma medida com efeitos sociais, como várias que terminaram em Portugal nos últimos anos.

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